Às vésperas de mais uma jornada de luta do 8 de Março, Dia Internacional das Mulheres, apresentamos um olhar sobre a história desta data a partir de seu significado para as lutas sociais, na História e hoje.
Confira o artigo escrito por Joana Emmerick, do PACS.
O Dia internacional das mulheres – 8 de março: reafirmar a luta feminista revolucionária!
Por: Joana Emmerick Seabra – PACS
Às vésperas do mês mais importante para a luta das mulheres, ao menos simbolicamente, é fundamental reafirmarmos o significado que esta data tem para as lutas anticapitalistas e revolucionárias de forma geral. Importante para evitar a reprodução de “mitos” sobre a data, presentes em reportagens televisivas, “memes” de redes sociais, periódicos, entre outras comunicações. As tentativas de apropriação ideológica que lhe retiram o caráter revolucionário inerente à sua história, tornando-a uma celebração da “essência” feminina. Mas, principalmente, para reafirmarmos a importância de nosso papel, enquanto mulheres trabalhadoras, auto-organizadas, nas lutas sociais comprometidas com a transformação radical desta sociedade capitalista e patriarcal, portanto, colonial, nas dimensões as mais diversas da vida social.
Então por que o Dia Internacional das Mulheres é realizado no dia 8 de março e por que esta data é tão significativa? É comum depararmo-nos com distintas explicações, mas uma bastante recorrente é a de que a data seria uma homenagem às centenas de trabalhadoras mortas em um incêndio ocorrido em 1857 . Frente a esta polêmica, a pesquisadora Ana Isabel González (2010) traz importante contribuição que comentamos a seguir.
No livro “As origens e a comemoração do Dia Internacional das Mulheres” (Expressão Popular/Sof, 2010), a autora busca desvendar as reais origens do Dia Internacional das Mulheres, o 8 de março. Ela demonstra que este “mito” encontra algum referencial na história e detém uma importância histórica para as lutas das mulheres, pois nesta tragédia, em que morreram 146 pessoas (123 mulheres), estavam as protagonistas da primeira greve organizada exclusivamente por mulheres naquele país. Uma greve que se alastrou por diversos estados nos Estados Unidos, levando à paralisação de entre 30 e 40 mil trabalhadores/as da indústria têxtil.
Mas, na mesma pesquisa, a autora traz evidências de que embora este incêndio tenha ocorrido em março de 1911, na fábrica The Triangle Shirtwaist Company, nos Estados Unidos, não é este o acontecimento original que levou à escolha do dia 8 de março como Dia Internacional das Mulheres. Ela argumenta que tal escolha[i] deveu-se à importância das manifestações das mulheres como estopim do processo que culminou na Revolução Russa, em 1917, manifestações estas ocorridas no dia 8 de março, ou 23 de fevereiro no antigo calendário russo.
Foi durante a Conferência das Mulheres Comunistas, paralela ao III Congresso da Internacional Comunista, em 1921, que a data foi acordada, como forma de lembrar a importância da organização das mulheres trabalhadoras para a Revolução Russa, nas lutas sociais gerais, estabelecendo uma data comum como dia Internacional, unificado, de luta das trabalhadoras.
Lembremo-nos de Clara Zetkin, Alexandra Kollontai, e tantas outras companheiras que enfrentaram os ditames patriarcais em seus partidos, e na sociedade, para reafirmar – prática e teoricamente – que a luta pela libertação das mulheres é um postulado necessário para a construção de outra sociedade; que a auto-organização das mulheres não provoca “divisionismos na classe”, mas é condição para a emancipação de todos e todas que tanto almejamos.
O trabalho comprometido de Ana Isabel González (2010) permite-nos rever as versões dominantes sobre a “primeira onda feminista” (ou mesmo esta forma de periodização). Isto é, na literatura dominante sobre o tema evidencia-se a importante luta das sufragistas pelo direito ao voto no ciclo mais geral de lutas abolicionistas e pelos direitos civis. Mas as trajetórias das socialistas e comunistas e, portanto, dos partidos “socialdemocratas” (como eram chamados à época) nesta luta ficam quase apagadas. Elas que atuaram para a conquista do direito ao voto, mas ampliando a agenda de luta para além do dogma liberal, demandando este e outros direitos como direitos universais; contribuindo para os avanços na auto-organização das trabalhadoras para a conquista de condições mais dignas de vida e trabalho.
No entanto, como decorrência positiva desta contra-história contada por González, outras ausências e invisibilidades sobre tal “primeira onda feminista” vem à tona. O que dizermos sobre as lutas das mulheres negras por libertação? Das mulheres e povos subalternizados, colonizados, neste mesmo período? Às vésperas do dia 8 de março, fica o questionamento: como apropriarmo-nos continuamente deste marco de luta com nossos feminismos periféricos, especialmente na América Latina? Feminismos construídos desde nossas experiências de organização popular, anticapitalistas, antipatriarcais, anticoloniais, antirracistas e anti-homofóbicas?
Às vésperas do mês mais importante para a luta feminista, reafirmemos a importância da nossa auto-organização nas lutas sociais na história, recriando e inventando subversões e revoluções frente à ordem dominante.
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GONZÁLEZ, Ana Isabel Álvarez (2010). As origens e a comemoração do Dia Internacional das Mulheres. Trad. Alessandra Seregatti… (et. al.). 1ªed. Apresentação: Nalu Faria. São Paulo: Expressão Popular: SOFI – Sempreviva Organização Feminina. 208p.
[i] A Cartilha comemorativa “101 anos do Dia da Mulher”, elaborada pelo Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC), também debate o tema, distinguindo-se em alguns detalhes do livro citado. Porém, ambos concordam que foi em 1910, durante a segunda Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, que Clara Zetkin sugeriu a adoção de um Dia Internacional das Mulheres, como um dia de luta internacional das socialistas. Desta forma, diferenciava-se do “Dia da Mulher”, comemorado então nos Estados Unidos, estabelecendo analogia ao marco de luta do 1º de maio. Porém, até 1921 esta data foi comemorada em dias distintos, nas diferentes localidades.
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