Na última quinta-feira, 27 de Março, a Secretraria de Ambiente do estado do Rio de Janeiro (SEA) promoveu uma audiência pública no bairro de Santa Cruz, zona oeste da capital, com o objetivo de apresentar à população os resultados da auditoria contratada para acompanhar o Termo de Ajuste de Conduta (TAC) firmado entre a própria SEA e a empresa ThyssenKrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA).
A TKCSA opera sem licença desde 2010 pois não conseguiu se adequar à legislação ambiental brasileira. O TAC funciona como improviso jurídico que permite a companhia manter-se aberta, irregularmente, ainda que sob protestos da população local atingida pelas “chuvas de prata” emitidas pela siderúrgica. O Ministério Público do estado do Rio de Janeiro (MPRJ), que também esteve presente na audiência, já abriu dois processos criminais contra a TKCSA e negou-se a assinar o TAC.
Na audiência de quinta-feira, a empresa buscava mostrar à população que supostamente havia cumprido o TAC. No entanto, os próprios auditores contratados pela TKCSA foram obrigados a admitir que mais de 13 cláusulas do termo não foram cumpridas, mantendo-se como “oportunidades de melhoria”, eufemismo para acobertar o não-cumprimento do acordo.
Já o representante do MPRJ, promotor Sandro Machado, foi mais incisivo e lembrou dos processos abertos contra a empresa. Além disso, Sandro questionou a falta de ambiente democrático na audiência, pois o auditório estava repleto de funcionários uniformizados da TKCSA (e não de moradores de Santa Cruz) que gritavam e assediavam aqueles que buscavam denunciar as violações cometidas pela empresa e pelos órgãos ambientais. O promotor chegou a pedir o microfone para coibir a postura de uma pessoa da organização do evento – que estava com crachá de “Apoio” – e constantemente insulflava os funcionários para que não permitissem falas contrárias à empresa.
O clima de intimidação e coação durou do começo ao fim da audiência. Houve tumulto, violência e insultos quando uma parlamentar da Assembléia Legistlativa do Rio de Janeiro exigiu a palavra para denunciar a empresa e a falta de divulgação prévia da audiência. Uma briga surgiu na frente do palco, com troca de socos, empurrões e pontapés por quase 10 minutos, tirando qualquer possibilidade de uma atmosfera democrática, com liberdade de expressão, se estabelecer.
Mas não foi apenas na platéia (de funcionários) que a lisura e a imparcialidade da audiência foram desfeitas. No palco, diretores da empresa se confundiam com auditores e autoridades públicas que deveriam fiscalizá-la. Por mais de uma vez, tanto auditores quanto o representante da SEA consultaram o diretor da TKCSA para conseguir responder às perguntas de pesquisadores, moradores, pescadores e demais presentes que questionavam, perplexos, a farsa que estava ocorrendo.
Ao fim, o MPRJ retirou-se antes de terminar a audiência, que já varava a madrugada. Por questão de segurança, os moradores, pescadores, pesquisadores e demais ativistas da sociedade civil que questionavam a relação entre os órgãos públicos e a empresa tiveram que sair juntos, para evitar represálias.
Uma audiência pública que fez de tudo, menos ouvir o público. Impedido de se manifestar diante do verdadeiro rolo compressor preparado pela empresa, tanto o povo quanto as normas democráticas ficaram esquecidas em Santa Cruz. O próprio telão mostrava que as relações público-privadas estavam por demasiado embaralhadas, pois a logomarca da TKCSA ficou estampada como se fosse a própria empresa a organizadora da audiência. De fato, era.
A TKCSA está acostumada a se auto-fiscalizar e também a transformar em propaganda publicitária as violações que pratica.
No entanto, a farsa não conseguiu alcançar os mínimos contornos de democracia. O próprio diretor da empresa mostrou-se várias vezes preocupado no palco, tentando orientar seus funcionários sobre que tipo de intimidações seriam toleradas pelas autoridades públicas e quais não seriam. É provável que o MPRJ, que presenciou todas as irregularidades, peça a anulação da audiência.
O TAC da TKCSA termina em 10 de Abril de 2014 e a empresa já estourou todos os prazos para seguir operando sem licença. Organizações da sociedade civil, moradores e pescadores prometem seguir na ofensiva denunciando os desmandos da empresa e a conivência do Estado com as violações de direitos praticadas em Santa Cruz e na Baía de Sepetiba.
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