Foto: Desinformemonos
por Iara Moura – Comunicação Pacs
Na próxima quarta feira, 15, o Conselho de Segurança da ONU irá se reunir para discutir a continuidade da Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti (Minustah). Integrada por vários países e liderada pelo Brasil, a Missão que estava prevista para durar seis meses completou dez anos de implantação em maio de 2014 sendo alvo de crítica da população local. Movimentos sociais da América latina e do Caribe expressaram sua solidariedade à resistência do povo haitiano e seu repúdio à Missão em carta publicada na internet ontem (07). O documento será entregue à Organização das Nações Unidas na próxima segunda-feira, 13, no Rio de Janeiro.
Em entrevista concedida à Red Eco no dia 3 deste mês, Camille Charmers, coordenador da Plataforma Haitiana de Ação por um Desenvolvimento Alternativo (PAPDA) e integrante da Rede Jubileu Sul América, defendeu a responsabilização da ONU pelas violações de direitos humanos cometidas no país e atestou a completa derrota da missão. Segundo o haitiano, não houve estabilização econômica, social e política. Pelo contrário, Camille denuncia que o índice de desemprego atinge atualmente mais de 60% da população economicamente ativa, a fome aumentou e tudo isso foi agravado com a introdução da bactéria causadora da cólera pelas forças policiais. A epidemia, até o momento, custou a vida de 9 mil haitianos e deixou um rastro de 730 mil infectados. Apenas em 2014 a previsão é de que outras 45 mil pessoas sejam infectadas.
Camille chama ainda atenção para o aporte de verbas destinado à manutenção da Missão que não é empregado efetivamente no combate aos problemas sociais do país: “A missão das nações unidas está investindo uma soma importante, em torno de 600 milhões de dólares por ano para manter a Minustah, sem nenhuma relação com os problemas básicos que vive o Haiti e sem aportes reais nas lutas do povo haitiano para sair da crise”, declara.
O Haiti é aqui: Minustah serve de laboratório para as UPPs
Desde a implantação da Missão, 20 contingentes de tropas, totalizando mais de 20 mil militares brasileiros, já passaram pelo Haiti. Além do Batalhão Brasileiro (Brabat), a missão mantém 177 engenheiros da Companhia de Engenharia da Força de Paz (Braengcoy), responsáveis pela mobilidade das tropas e pelo mapeamento para obras de infraestrutura. Com esse cenário o Brasil é o país com o maior número de soldados na ocupação e lidera as ações militares.
Camille também avalia que houve fracasso na questão da segurança pública, uma vez que para este, esta depende de outros investimentos sociais fundamentais. O pesquisador denuncia o aumento do tráfico de drogas desde a implantação da missão, especialmente da Cocaína que passa do Haiti para os Estados Unidos.
Além disso, a soberania política do país não vem sendo respeitada. Há três anos não ocorrem eleições municipais e legislativas e as organizações políticas e movimentos sociais tem tido sua ação dificultada por forças da Missão. “As piores eleições foram as últimas, com a intervenção vergonhosa da Minustah e da Organização dos Estados Americanos (OEA), manipulando os resultados, praticamente um golpe eleitoral de estado”, denuncia o haitiano. Como resultado deste cenário, a taxa de abstenção nas últimas eleições presidenciais foi altíssima. Somente 17% do eleitorado compareceu ao pleito.
Apesar de terem características e motivações diferentes os conflitos no Haiti e a ocupação militar nas favelas do Rio guardam algumas semelhanças. Em maio de 2013, o então governador do estado do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), e o primeiro-ministro haitiano, Laurent Lamothe, assinaram um acordo de cooperação entre a PM do Rio e a Polícia Nacional Haitiana (PNH) para a troca de informações sobre a evolução da política de UPPs no Rio, em comparação com os “pontos fortes” nas favelas haitianas. Dois meses mais tarde, uma comissão da PNH viajou ao Rio para conhecer novas UPPs, assim como o treinamento do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e do Batalhão de Choque.
Para Sandra Quintela, coordenadora do Pacs – Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul e também integrante da Rede Jubileu Sul, ambas visam lidar com problemas sociais graves, como sub-emprego, fome e negação do direito à moradia digna, como se fossem questões restritas ao âmbito da segurança. Desta forma, moradores de periferias e favelas, são tratados como ameaças que devem ser contidas ou pacificadas.
“Trata-se, portanto, de uma política de contenção social, implementada por um setor dominante da sociedade, contra outro, que fica dominado. O resultado é uma criminalização da pobreza em si, na qual os moradores de Cité Solei ou da Favela da Maré ficam a mercê de um Estado de Exceção militar que viola direitos cotidianamente em nome da ordem”, explica Sandra.
A íntegra da Carta de rechaço à renovação do mandato da Minustah no Haiti pode ser acessada no seguinte endereço: goo.gl/QgW1E3 . Além da entrega da carta, os movimentos realizarão uma panfletagem para esclarecer a população brasileira sobre o tema na próxima segunda (13), na Central do Brasil, a partir do meio-dia.
Mais informações
PACS – Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul
Rua Evaristo da Veiga,47/702 – Centro, Rio de Janeiro – CEP 20031-040 – Telefone: +55 1 2210-2124 / [email protected]
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